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A Legalidade da Venda de Cogumelos Contendo Psilocibina no Brasil: Análise da Situação Jurídica e Implicações Legais


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A questão sobre a legalidade da venda de cogumelos contendo psilocibina no Brasil envolve nuances jurídicas complexas que geram interpretações divergentes entre especialistas do direito, autoridades policiais e defensores de seu uso. Esta análise busca esclarecer o status legal desses cogumelos e se sua comercialização constitui tráfico de drogas conforme a legislação brasileira atual.


O Status Legal da Psilocibina e dos Cogumelos no Brasil

A situação legal dos cogumelos psilocibinos no Brasil é caracterizada por uma aparente ambiguidade normativa. A psilocibina e a psilocina, substâncias psicoativas presentes nesses cogumelos, estão explicitamente proibidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) através da Portaria 344/1998, onde constam na lista F2 de substâncias psicotrópicas de uso proscrito[1][2]. Segundo esta regulamentação, apenas medicamentos registrados podem ser prescritos com estas substâncias, sendo necessária autorização especial para pesquisa e manipulação[1].

Entretanto, o corpo fúngico em si - os cogumelos do gênero Psilocybe, como o Psilocybe cubensis - não está explicitamente listado na legislação brasileira de drogas[3][4]. Esta distinção entre a substância proibida e o organismo natural que a contém cria o que alguns juristas chamam de "vazio legal"[5]. A Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) não menciona diretamente os cogumelos, o que abre espaço para interpretações diversas sobre a legalidade de sua comercialização[4].


Interpretação das Autoridades Policiais

Apesar da ausência de menção explícita aos cogumelos na legislação, as autoridades policiais brasileiras têm consistentemente tratado a venda e cultivo desses fungos como tráfico de drogas. Em abril de 2024, a Polícia Federal deflagrou a operação Hofmann em Belo Horizonte, visando combater o tráfico de cogumelos alucinógenos vendidos pela internet[6][7]. Durante esta operação:

1.      Foram cumpridos dois mandados de busca e apreensão

2.     Foi determinada a suspensão de atividade da empresa investigada

3.     O site de vendas foi retirado do ar

4.     Foram apreendidos cogumelos, esporos e materiais para cultivo[6]

Similarmente, em setembro de 2024, a Polícia Civil de Goiás desarticulou um laboratório de cogumelos alucinógenos que funcionava em um escritório de advocacia[8][9]. O investigado comercializava cogumelos da espécie psilocybe cubensis e produtos derivados (chocolates e cápsulas) através de redes sociais, enviando-os pelos Correios para todo o país[8].

Controvérsias Jurídicas e Interpretações Divergentes

A divergência entre as autoridades policiais e especialistas jurídicos centra-se na questão da tipicidade da conduta. Enquanto a polícia enquadra a venda dos cogumelos como tráfico com base na presença da substância proibida, alguns juristas argumentam pela distinção entre o "corpo" do cogumelo e a substância isolada ou sintetizada[10].

Esta controvérsia é evidenciada por decisões judiciais recentes. Em outubro de 2024, a Justiça de Goiás determinou a soltura de um empresário preso por cultivar "cogumelos mágicos", considerando a prisão ilegal[11]. Embora a decisão tenha se baseado em vícios procedimentais da investigação, o caso ilustra os desafios na aplicação da lei nesta matéria.

O debate jurídico é ampliado pela seguinte consideração: "Com efeito, as substâncias DMT, psilocibina e mescalina não podem ser comercializadas diretamente no Brasil", porém, há uma diferenciação entre a substância isolada e o organismo natural que a contém[10].


Operações Policiais e Consequências Penais

As operações policiais contra a venda de cogumelos com psilocibina têm sido frequentes no Brasil. As autoridades afirmam que os responsáveis pela venda podem enfrentar penas de até 15 anos por tráfico de entorpecentes[6][7]. Estas operações geralmente envolvem:

1.      Monitoramento de sites e redes sociais que comercializam os cogumelos

2.     Cumprimento de mandados de busca e apreensão

3.     Suspensão das atividades comerciais dos investigados

4.     Retirada dos sites de venda do ar

5.      Apreensão dos cogumelos e materiais de cultivo[6][8]

Os casos recentes demonstram que as autoridades estão atentas a diversas formas de comercialização, desde a venda dos cogumelos in natura até produtos derivados, como chocolates e cápsulas contendo a substância[8][9].


Contexto Científico e Potencial Terapêutico

Paralelamente às questões legais, estudos científicos têm destacado o potencial terapêutico dos cogumelos contendo psilocibina. Pesquisas apontam benefícios no tratamento de condições como depressão, ansiedade e dependência química[12][10]. Um estudo conduzido pelo Instituto Micélio Sagrado analisou 112.451 ocorrências de eventos adversos relacionados ao uso de substâncias entre 2007 e 2022, constatando apenas 13 registros envolvendo cogumelos psicodélicos, sem sequelas permanentes ou mortes[12].

Este contraste entre o rigor da aplicação da lei e as evidências científicas gera questionamentos sobre a classificação da psilocibina como substância de alto potencial de abuso e sem uso médico reconhecido[3][12].


Conclusão

A venda de cogumelos contendo psilocibina no Brasil situa-se em uma zona juridicamente ambígua. Embora os cogumelos em si não estejam explicitamente proibidos na legislação brasileira, a presença de psilocibina — substância proscrita pela Anvisa — tem levado as autoridades a tratarem sua comercialização como tráfico de drogas.

Na prática atual, indivíduos envolvidos na venda desses cogumelos enfrentam processos criminais e potenciais condenações por tráfico de entorpecentes, com penas que podem chegar a 15 anos de prisão[6][7]. Simultaneamente, cresce o debate jurídico e científico sobre a adequação dessa abordagem, especialmente à luz das pesquisas sobre o potencial terapêutico da psilocibina e a baixa incidência de eventos adversos associados ao seu uso[12][10].

Esta tensão entre a aplicação da lei e as evidências científicas emergentes reflete um momento de transição na compreensão social e legal dessas substâncias, similar ao que ocorre em outras jurisdições pelo mundo onde reformas na regulamentação de psicodélicos estão sendo consideradas ou implementadas.


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